
Negociar a venda de uma instituição financeira aparentemente falida para um grupo com vínculos nos Emirados Árabes Unidos (o famoso Victor Holding) e desaparecimento de forma discreta no cenário luxuoso de Abu Dhabi, era esse o plano do banqueiro Daniel Vorcaro, dono do Banco Master.
Anunciada de forma apressada, a venda parecia ser uma solução mágica para os problemas do Master, que possuía ativos totais em torno de R$ 86 bilhões. Porém, como na comédia de erros que se tornou o Brasil, o enredo desandou.
O banqueiro foi pego de surpresa pela Polícia Federal no Aeroporto de Guarulhos. Não estava em viagem de negócios para revisar documentos, como foi dito na versão oficial, mas sim escapando de uma prisão preventiva já imposta. Vorcaro foi preso e, no mesmo dia, o Banco Central (BC) liquidou parte do conglomerado Master, interrompendo abruptamente as negociações com o grupo Victor.
O que os investigadores descobriram? Que o “acordo” era, no mínimo, conveniente. A venda de uma entidade que emite R$ 40 bilhões em CDBs mensalmente — títulos que prometiam retornos tão elevados (até 177% do CDI) que apenas um lunático compraria ou um desesperado aceitaria. A sensação é de que a negociação serviu apenas como uma cortina de fumaça para garantir o jatinho particular e a rota fuga.
A liquidação do Banco Master, a maior ação do sistema financeiro brasileiro nos últimos tempos, realmente abriu a Caixa de Pandora. O problema, no entanto, não é só financeiro. A falência de uma instituição que operava com juros tão esdrúxulos é o esperado.
O que causa medo e pânico em Brasília é o que está escondido debaixo do tapete. Sabe-se lá quantos “esqueletos” o liquidante do BC encontrará, nem quem serão os outros banqueiros e, principalmente, os políticos que fugirão quando a tampa do esgoto for levantada.
A corrupção comprovada e o BRB solidário
A operação que resultou na prisão de Vorcaro e seus sócios (Augusto Lima e o tesoureiro Alberto Félix) não teve como alvo um crime simples, mas de bilhões de reais: a falsificação de títulos de crédito. O caso não envolvia apenas títulos insubsistentes ou dívidas prescritas, mas também falsificação grosseira e totalmente fabricada.
A alta cúpula do Banco Master fabricava carteiras de crédito sem lastro real, transformando promessas vazias em ativos negociáveis. O golpe foi tão descarado que incluiu a criação de títulos associados a pequenas entidades, como a dos servidores da Saúde da Bahia, que nem possuíam contas bancárias ou contratos de consignado para justificar a dívida. Quando a farsa foi desmascarada (cerca de R$ 4 a 5 bilhões), a solução foi ainda mais engenhosa: o Master e o BRB adquiriram uma empresa de fachada, mudaram o nome para Tirreno e, pasmem, realizaram novos contratos falsos para tentar cobrir a fraude.
E é aqui que o escândalo deixa de ser apenas sobre um banco privado desonesto e se torna uma afronta à nação. Quem estava do outro lado, "adquirindo" essas bombas podres do Master? O BRB — Banco Regional de Brasília, uma entidade pública sob controle do governo do Distrito Federal.
Sob a gestão de seu presidente, Paulo Henrique Costa, o BRB atuou como uma autêntica caixa de assistência social para a má administração privada do Master. Quando a fiscalização do Banco Central apontou a insubsistência dos créditos, o BRB, em vez de recuar, simplesmente aceitou que fossem trocados por outros "ativos", sem qualquer avaliação técnica.
Há suspeitas de um grande conluio: Master e BRB teriam firmado contratos para justificar o desvio de R$ 12 bilhões. Exatamente, R$ 12 bilhões.
Este é considerado o maior escândalo da história dos bancos brasileiros, aos quais o governo nos 12 meses terminados em agosto de 2025 pagou aproximadamente R$ 946,5 bilhões.
O presidente do BRB, flagrado nesse esquema, teve sua prisão decretada pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal. No entanto, a justiça, sempre cautelosa em proteger os seus pares, apenas autorizou o seu afastamento. Que coisa boa!
Enquanto os diretores e funcionários do Master foram presos, os altos funcionários públicos envolvidos em desvio de dinheiro dos contribuintes receberam apenas um leve puxão de orelha. Antes mesmo de considerar a aquisição do banco, os técnicos do BC constataram que o BRB estava transferindo R$ 8 bilhões para a Master sem nenhuma justificativa ou análise interna. Já disse que o BRB é um banco público?
Em resumo, enquanto o setor privado criava dívidas e títulos falsos, o dinheiro público (a grana dos contribuintes) entrava de forma clandestina, sem lastro e sem escrúpulos, para evitar que o "amigo" Vorcaro falisse. Essa é a definição mais cínica de socialização de prejuízos que existe.
As mesas de jantar da "democracia"
A falência do Banco Master está gerando tremores em Brasília. Além de responsabilizar o Banco Central — que tem sete de seus nove diretores indicados por Lula, incluindo o presidente Gabriel Galípolo — o escândalo também expôs o papel do BRB.
O BRB, sendo um banco estatal regional com relações com o governo federal e seus satélites políticos, está no centro da administração pública e na esfera de influência de Lula e Haddad. Contudo, o que realmente causou forte impacto político foi a revelação dos tentáculos de Daniel Vorcaro nos mais altos níveis do poder.
O banqueiro, que havia sido alvo de um pedido de prisão em 2019, mas não foi preso por razões desconhecidas, dedicou os últimos anos a uma atividade ainda mais rentável do que a fraude: financiar a elite da “democracia” brasileira.
Com processos em andamento no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF), Vorcaro abriu os cofres para financiar eventos de luxo que levavam a nata da nata do judiciário para falar sobre "Estado Democrático de Direito" em destinos paradisíacos, longe do Brasil real.
O Primeiro Fórum Jurídico Brasil de Ideias foi patrocinado pelo Banco Master em abril eo ano passado, em Londres. E os palestrantes? Nomes de destaque, como Gilmar Mendes, e o atual Ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski (que, após deixar o STF, já integrou a equipe de Vorcaro como consultor estratégico). O toque final: a ilustre presença do magnânimo e excelentíssimo protetor da democracia brasileira, o muro, o caçador de golpistas, rei dos onze togados, a mente mais brilhante do Judiciário brasileiro, o primeiro de seu nome, Alexandre de Moraes.
Mas a verdadeira obra-prima do cinismo se deu em Nova York, onde o banqueiro encomendou um banquete para 150 pessoas em um restaurante que abriu fora de hora. O jantar, regado a bebidas finas (Chardonnay, Tequila, Whisky Johnny Walker Black) e pagos por uma pessoa com mandado de prisão de R$ 12 bilhões, tinha como convidados de honra, novamente, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso.
É curioso, para dizer o mínimo, como um sujeito investigado por um gigantesco esquema de falsificação era amigo íntimo, patrocinador e anfitrião de jantares para os ministros que deveriam ser os guardiões da lei no país. O que será que eles discutiam entre um gole de Black Label e outro? Certamente, o tema não era a prescrição de dívidas falsas, mas sim a "proteção" da nossa frágil democracia.
O desespero em Brasília e o corporativismo imbatível
O pânico tomou conta de Brasília. As investigações já indicam que as operações do Master envolveram pressões diretas de governadores e membros do parlamento. Daniel Vorcaro possui uma vasta rede de conexões políticas, que vai desde o ex-presidente Michel Temer (com quem o banqueiro atuava como consultor) até Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo Lula no Senado, que mantém uma relação próxima com o sócio preso, Augusto Lima. Trata-se de uma aliança entre a política tradicional e a "nova".
No entanto, o cúmulo da hipocrisia e do corporativismo ocorreu quando o Banco Master, para se proteger judicialmente das enrascadas que ele mesmo criou, contratou o escritório da advogada Viviane Barce de Moraes, esposa de Alexandre de Moraes. A mesma mulher que foi sancionada pelo governo dos Estados Unidos pela Lei Magnitsky e teve seu passaporte suspenso. A escolha, obviamente, não foi por acaso. O Master tinha o contato e o acesso.
A prisão de Daniel Vorcaro foi um pingo de esperança para quem ainda acredita em justiça. Foi lindo ver a Polícia Federal agindo contra a corrupção de alto calibre novamente. No entanto, o otimismo é, por natureza, ingênuo no Brasil. A grande dúvida que paira no ar de Brasília é: quanto tempo até o banqueiro receber um habeas corpus?
Se Vorcaro realmente acabar preso, a delação poderá vir, e a lista de convidados dos jantares em Nova York deixará de ser apenas um registro fotográfico de socialização. É mais provável que Vorcaro obtenha a salvação da Suprema Corte em nome do "Estado Democrático de Direito" — um conceito amplamente defendido nos fóruns patrocinados por ele.
Seguindo o roteiro clássico, ele poderá sair do país antes de ter que enfrentar as consequências de seu rombo. E quanto aos R$ 12 bilhões? Ah, esses acabam sendo pagos pelo contribuinte, de alguma forma, como mais uma evidência de que, no Brasil, a corrupção não se oculta: ela senta à mesa com aqueles que deveriam combatê-la. (Paula Sousa é historiadora, professora e articulista; 19/11/2025)
Viviane Barci de Moraes representou a instituição em ações na Justiça; empresário foi preso nesta terça-feira (18/11)
O Banco Master, do empresário Daniel Vorcaro, preso nesta terça-feira (18/11) pela Polícia Federal (PF), contratou o escritório Barci de Moraes, onde trabalham a mulher e dois filhos do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). As informações são da jornalista Malu Gaspar, do jornal O Globo.
Daniel Vorcaro foi preso em Guarulhos (SP) no âmbito da Operação Compliance, que investiga a emissão de títulos de crédito falsos por instituições financeiras. A ação ocorre um dia após o Banco Central decretar a liquidação extrajudicial do Banco Master, medida que encerrou de imediato a possibilidade de avanço nas negociações de venda ao Grupo Fictor.
Viviane Barci de Moraes representou o Master em ações na Justiça. O banco não revela quais são os processos ou quanto ela já recebeu. No âmbito do STF, Viviane atua em pelo menos 30 processos públicos, mas não consta no arquivo processual da Corte ações ligadas ao Banco Master, de acordo com a reportagem.
O mesmo escritório atuou na defesa de Alexandre de Moraes e sua família na investigação sobre o episódio em que o ministro teria sido agredido por brasileiros no aeroporto de Roma, em julho de 2023.
O banco já firmou outros contratos com figuras públicas, como o hoje ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, após ele ter se aposentado do Supremo, em 2023. Na época, ele receberia um salário de aproximadamente R$ 100 mil.
O Banco Master pertence ao mineiro Daniel Vorcaro, que é sócio em empresas de diversos ramos (como o Fasano do Itaim, em São Paulo, e o Will Bank) e dono de aproximadamente 26% da Sociedade Anônima de Futebol (SAF) do Atlético Mineiro.
Em 2023, ganhou destaque nacional ao gastar cerca de R$ 15 milhões na realização da festa de 15 anos da filha em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte, com direito a show do DJ Alok. Na mesma época, ele teria comprado a mansão mais cara já negociada em Orlando, na Flórida, com um valor de US$ 37 milhões.
O Master tinha em sua carteira um total de R$ 8,7 bilhões em precatórios, que são dívidas do governo oriundas de ações judiciais. O banco tem em andamento uma ação contra a União que trata do recolhimento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), sob relatoria do ministro Gilmar Mendes (Blog O Tempo, 18/11/25)